Desde que estudei sobre a Segunda Guerra Mundial no ensino fundamental, passei a ter muito interesse no assunto. Pensei na possibilidade de visitar Auschwitz, mas sabia que precisava estar preparada pra isso. Li inúmeros livros sobre holocausto, nazismo, fascismo, a vida de Hitler, a vida dos judeus, a vida pós-guerra, li todas as revistas de história que eu encontrava sobre o assunto e até fui a palestras de italianos filhos de sobreviventes contando as histórias de seus pais. Ainda não foi suficiente.
Eu só tinha um final de semana na Cracóvia e queria visitar tanto Auschwitz quanto a mina de sal, então comprei os dois passeios juntos. Paguei em média 80 euros pelos dois, incluindo transfer do hotel até os lugares, visita guiada nos dois, lanche e transfer de volta ao hotel. A visita inclui dois campos: Auschwitz I e Auschwitz II – Birkenau.
portão Auschwitz I
Auschwitz I era um antigo quartel polonês que foi tomado pelos alemães. Na entrada, o famoso portão com a frase “Arbeit Macht Frei” (“o trabalho liberta”). É nos prédios desse campo que fica o museu. Lá podemos ver vários objetos que restaram dos últimos dias antes da chegada dos russos – apenas dos últimos dias, pois todos os bens eram enviados para os alemães. Podemos ver também as latas dos venenos usados nas câmaras de gás, os quartos
onde dormiam os prisioneiros, as celas, a primeira câmara de gás construída para teste, fotografias dos prisioneiros, toneladas de cabelo feminino (a pior parte), a famosa parede da morte e inúmeras malas dos prisioneiros que chegaram no último trem. Todas as malas tinham nomes escritos, algumas também tinham a data de nascimento e endereço. Eles tentaram da melhor forma identificar seus pertences, pois cada um só poderia levar uma mala, então
levaram tudo que tinham de mais precioso. Não faziam ideia do que os esperava.
câmara de gás
parede da morte
A princípio, os prisioneiros eram executados nessa parede à tiros, porém levava tempo, fazia muito barulho e muita bagunça. Os nazistas precisavam de algo mais potente, mais eficiente. Foi aí que criaram as câmaras de gás. Nessa visita guiada é possível entrar na primeira câmara construída e ver os buracos no teto por onde eles jogavam o veneno. Eu confesso que ainda não tenho estômago pra descrever a energia daquele lugar. É quase como se as almas ainda estivessem ali. A energia é muito forte, não só dos judeus, mas também as dos nazistas. A sensação que eu tive era de como se eu pudesse ouvir, ao mesmo tempo, o grito de socorro das almas inocentes e a risada orgulhosa dos monstros que faziam isso.
Auschwitz II é 22 vezes maior que Auschwitz I. Nenhum prédio está aberto para visitas, exceto o prédio dos banheiros que é uma réplica do original. As câmaras de gás foram explodidas pelos nazistas para que não ficassem vestígios dos crimes cometidos naquele lugar. As ruínas permanecem lá exatamente da forma que eles deixaram. É inexplicável a agonia que eu senti vendo aquelas ruínas.
ruínas Auschwitz II
É também em Auschwitz II que vemos a famosa linha do trem por onde chegavam os prisioneiros. No meio do campo, havia uma seleção. Os médicos e guardas nazistas escolhiam quem iria trabalhar e quem iria direto para a morte. Os escolhidos para trabalhar iam pros campos – os outros seguiam direto no trem até o fim da linha, onde seria, também, o fim de suas vidas. Quando os nazistas souberam que a guerra estava perdida e os russos estavam chegando, não se preocuparam mais em recrutar trabalhadores. Todos iam direto para a morte. Não havia espaço para tanta gente nos crematórios, foi quando começaram a queimar os corpos ao ar livre. E os próprios prisioneiros tinham que limpar a bagunça depois.
linha do trem
sapatos perdidos
Não sei se você, que está lendo isso, acredita em energia. Mas depois dessa visita, fica impossível não acreditar. Eu senti tudo conforme passava pelos lugares. Senti desespero, agonia, tristeza, solidão. No total, a visita durou em média 5 horas. Depois de 3 horas eu já estava doida para sair dali. Isso porque eu havia me preparado muito. Mas você nunca está preparado o suficiente para visitar um local criado para extermínio de vidas inocentes onde 1,3 milhão de pessoas sofreram todo tipo de humilhação possível até serem mortas como se fossem pulgas. Hoje é quarta-feira, fiz a visita no domingo. Ainda tenho dificuldades pra dormir. Ainda fico com as imagens na cabeça toda vez que fecho os olhos. Ainda saio na rua e me pergunto como as pessoas conseguem viver felizes fingindo que nada disso aconteceu. Foi horrível, foi pesado, sombrio, macabro. Eu queria poder não lembrar das coisas que vi. Mas tudo aconteceu, e precisa ser lembrado.
Eu não chorei. O impacto foi muito grande. Não tive tempo para chorar. Foi o dia mais pesado da minha vida. Mas é importante lembrar que o mundo não mudou. As ideias que levaram os nazistas a fazerem o que fizeram ainda existem nos dias de hoje. A diferença é que ainda não surgiu um Hitler para pô-las em prática. Sendo assim, vale a visita. É importante ver o quão absurdo foi o nosso passado para refletirmos sobre o nosso presente e impedirmos que o futuro seja assim tão trágico.
Esse post faz parte do projeto “leitores no blog” onde cada um pode enviar sua história de viagem e aparecer por aqui. O post de hoje foi escrito pela Deborah Izel, você pode encontrar ela no Instagram: @deborahizel . Ela é au pair na Bélgica e fala bastante sobre sua vida e viagens por lá.